Idiotas Inteligentes

Foto: Brock Davis

Foto: Brock Davis

Uma coisa que já percebi que diferencia os alunos americanos dos brasileiros é a obsessão dos americanos por notas. Não todos eles, mas a maioria não se contenta apenas em passar na disciplina. Eles querem a melhor nota, estão em busca do GPA (Grade Point Average), a nota média de todas as disciplinas cursadas que, teoricamente, vai abrir as portas das melhores oportunidades de emprego quando se formarem.

O GPA, assim como o Enem/Enade no Brasil, é uma métrica que simboliza o aproveitamento acadêmico do aluno. Na maioria das vezes, é baseado no conhecimento adquirido e algumas competências desenvolvidas. O método de ensino está fortemente baseado nestes instrumentos. Podemos dizer que uma coisa está dando certo, o quociente de inteligência (QI) vem aumentando ano após ano desde a segunda guerra mundial. Na média mundial em países desenvolvidos, o crescimento chega a 3 pontos por década. Este dado é tão significativo que podemos dizer que se uma criança de hoje fizesse este teste de QI há três gerações seria considerada um gênio.

É importante ter instrumentos que medem o desempenho, a sociedade de um modo geral vem depositando muita fé apenas nestas métricas, a julgar pela reação dos alunos a qualquer menção que possa afetar o GPA deles. Com duas gerações de gênios seria de esperar que nossa sociedade estivesse bem melhor do que estamos hoje, com os problemas de pobreza resolvidos, melhor adaptados para as mudanças climáticas ou livres de discriminações de qualquer espécie. O motivo por não estarmos melhores é que, nos dias de hoje, o QI continua sendo tão importante quanto no século passado, mas não mais importante que outras competências, como a criatividade, sabedoria, inteligência emocional ou habilidades sociais, nada disso medido por QI.

O psicólogo Robert Sternberg da Cornell University declarou que estamos construindo uma sociedade de idiotas inteligentes. Seu argumento é que o sistema educacional direciona os jovens para as melhores universidades baseado nos resultados dos testes, muito parecidos com a forma como se mede QI, mas estes jovens não estão efetivamente fazendo as mudanças significativas e necessárias para tornar o mundo melhor, justamente porque nunca lhes disseram que as competências necessárias para protagonizar estas mudanças, e que vão bem além da inteligência, nunca foram medidas, consequentemente nunca foram exigidas deles.

Os chamados changemakers – protagonistas das mudanças de impacto – não são apenas inteligentes. Sua capacidade de perceber a realidade à sua volta, de identificar oportunidades em nichos de atividades não explorados, de ser empático à realidade alheia, de mostrar quem é por meio de ações ao invés de palavras, de demonstrar controle em meio ao caos e à crise, de transmitir calma e serenidade as pessoas à sua volta da mesma forma como as energiza quando é necessário, de entender como as partes se interconectam para formar o todo, entre outras características, todas marcantes, não são formadas pelo sistema  de ensino formal.

Posso dizer, baseado em todos os meus anos de experiência docente e auxiliando empreendedores nascentes, que pouquíssimos dos meus alunos com alto GPA se tornarão changemakers. Vão ser excelentes funcionários, sem a menor dúvida, mas foram levados a acreditar que a inteligência vai ser a ferramenta de transformação que eles almejam provocar. Quando a realidade mostrar a crueza de suas limitações pode ser tarde demais.

A saída? O algo a mais. Junto com a educação formal, ou logo depois de se formar, complementar sua formação com o desenvolvimento de outras competências, preferencialmente por meio de métodos diferentes do ensino tradicional, ter um mentor, viajar, conhecer pessoas diferentes, se desafiar, tentar e errar, aprender arte, aprender línguas, explorar outros sentidos, ampliar a diversidade do seu repertório de experiências.

Não deixe de lado um bom desempenho no ensino formal, pois é o que permite você entrar no jogo, mas é o ‘algo a mais’ que vai te ajudar a ganhar o (seu) jogo.

 

Por Marcos Hashimoto

Co-fundador da Polifonia e Professor de Empreendedorismo na Universidade de Indianapolis - EUA, consultor de negócios e especialista em inovação corporativa.

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